sexta-feira, 4 de julho de 2014

A Copa longe da TV - Parte I

Postado por Dona Maria às 18:00
Se por um lado a grande mídia anda dizendo que essa é a Copa das Copas, que está tudo um primor em organização e hospitalidade, eu ouso aqui dizer tudo que vi e vivi nesses dias de Copa com jogos que aconteceram em minha cidade.

Dia 13, segundo dia da Copa, Salvador recebeu, em minha opinião, um dos melhores jogos desse mundial: Espanha e Holanda, com a partida terminada em um boa goleada para o time da laranja mecânica.

Reza a lenda, que logo pela manhã os holandeses fizeram uma linda festa no largo do Terreiro de Jesus, no Pelourinho. Trabalhadora e pagadora de impostos que sou, não pude acompanhar e por este motivo não farei nenhum comentário sobre essa, até então, linda festa.
Como money que good nós não have, eu, obviamente, acompanhei todos os jogos longe dos olhos, mas perto do coração. Ou seja, não fui ao estádio, mas fui ao Pelourinho, que para quem gosta de folia, dá no mesmo. 

Cheguei faltando uns 10 minutos para o início do jogo e encontrei um Pelourinho quase vazio. Acabei assistindo o jogo no meio da rua, em uma TV improvisada. No intervalo do primeiro tempo, fui na tradicional sorveteria A cubana e me assustei ao perceber que o preço da bola de sorvete havia duplicado. Quer dizer, fiquei meio assim, mas não assustada. Em uma cidade que costuma triplicar o preço das coisas no verão, é até "aceitável" que se dobre o preço em um evento do porte de uma Copa do mundo. Paguei 15 reais em duas bolas de sorvete de sabor mais ou menos e em um local com funcionários com humor de menos. Bem menos. A sensação que tive é que estavam todos contrariados em estar trabalhando no dia do jogo.

Fim de partida, a chuva resolveu aparecer, percorri algumas ruas procurando alguma atração interessante. Não tinha. O jogo acabou às 18h, mas a primeira atração da noite, contrariando a programação local, que informava shows às 19h, só aconteceria às 21h. Cumprir horário é para fracos. Os fortes deixam o povo esperando e dane-se. 

No Largo Quincas Berro D'água, onde aconteceria um dos shows e que abriga o tradicional bar Habeas Copos, os comerciantes locais torciam a cara ao perceberem que eu era nativa local. Minhoca da terra não interessa para eles. Querem os gringos. O dólar, o euro..
Neste mesmo local, vi uma ambulante que fica bem em frente a única baiana que tem nessa praça, vender um cigarro, veja bem, um cigarro e não uma carteira, por 15 reais.
O turista, que devia estar acostumado a comprar cigarros, achou o preço abusivo e reclamou algo em um idioma que não compreendi, mas que foi devidamente rebatido pela vendedora que berrou com cara de poucos amigos: "o que é? Está achando caro? Você está se divertinU e eu estou trabaIANU. 

Como eu estava vestida com uma camisa do Barcelona, time da Espanha, e sou bem branquinha do cabelo liso (de chapinha, é verdade), fui facilmente confundida com turista. Era abordada constantemente por alguém com um portunhol vergonhoso.  Ao notarem o meu sotaque nordestino e o vocabulário vasto em gírias locais, perdiam o interesse e partiam para abordar um outro turista, mas desta vez, de verdade.
Após andar por quase todos aqueles becos, vielas e ruas escorregadias, por conta da chuva, resolvi parar no Largo do Terreiro de Jesus e comprar uma água mineral. Ao perguntar o preço para o ambulante, que pensei ser o dono do isopor, ele passou a pergunta para uma baiana de acarajé, essa, sim, dona do negócio, que antes de responder me olhou fixamente por uns 40 segundos, olhou para a camisa do Barcelona e disparou: "10 reais a água".
DEZ REAIS por um copinho de água mineral. Surreal. 
Agradeci e comprei no ambulante, do outro lado da rua, a mesma água por 3 reais. Caro, é verdade, mas nada perto dos dez reais da baiana. Me senti lesada, mas não roubada.

Como a chuva não dava trégua, resolvi voltar para casa. Ao descer a ladeira e me dirigir ao ponto de táxi, fui logo abordada por um motorista que tentava se comunicar em portunhol. Pedi para ele guardar o idioma, pois eu era da terra. Ao perceber que eu era apenas mais uma soteropolitana, ele perguntou o itinerário. Quando respondi Brotas, que é um bairro que fica relativamente perto do Pelourinho, ele simplesmente olhou na minha cara e disse NÃO.
"Não estou fazendo corrida para perto. Não compensa. " Assim, na maior naturalidade. E eu ali, atônita, achando que era uma brincadeira. Perguntei se era sério e ele disse que sim, que era seríssimo. Para coroar a minha perplexidade, ele ainda disse: "Está passando ônibus ainda, por que a senhora não pega um?"
Gente, se eu quisesse pegar um ônibus, certamente teria me dirigido ao ponto de ônibus, mas se fui para o ponto de táxi é porque eu queria pegar um táxi. Não peguei.
Todos, eu disse todos os taxistas da fila, numa espécie de código de ética da sacanagem, estavam recusando corridas para quem era de Salvador, caso a pessoa não morasse longe. 
Chamei um policial, relatei o que estava acontecendo e ele me disse que sentia muito, mas que não tinha como obrigar o motorista a fazer a corrida e mesmo se tivesse como, ele não faria, porque isso poderia me colocar em risco. O jeito foi voltar de ônibus, quase 23h. 

Quando estava descendo a ladeira, antes de chegar no ponto de táxi, passei por outra baiana de acarajé, que fica bem próxima, quase do lado, do bar da Neuzão, no filme Ó paí, ó, e vi um grupo com cinco ou seis turistas se deliciando na iguaria. Ao lado da baiana estava um senhor, que deve ser amigo ou parente dela, que quando viu os turistas comendo feito loucos, disparou: Joana, meta a faca. Cobre bem caro desses aí. Joana, a baiana, sorrindo respondeu: "tô ligada. Tá pensando que sou besta, é?"

Isso é Brasil. O país da Copa das Copas. 


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